O Ministro da Saúde, Correia de Campos, deu ontem uma grande entrevista à Judite de Sousa, senhora que dá um sentido mais literal à expressão “mulher que dorme com o inimigo” sempre que entrevista membros do governo.
Pois bem, em jeito provocatório, a senhora apresentadora encurralou o nosso mui digníssimo representante para as maleitas quando, sem apelo nem agravo, lhe atirou com um “como quer que alguém que ganhe 600 euros por mês consiga pagar todas as taxas impostas na saúde, agora que vão ser pagos os internamentos?”.
O ministro, brilhante, retorquiu com valentia e saber, munido do mais exacto e matemático dos argumentos, fazendo jus à sua fama de cientista: “sabe quanto é que essas pessoas gastam em cigarros, ou em cinema? Quanto é que isso dá ao fim do mês?”. Meus amigos, este é O Argumento. Não é um daqueles argumentozinhos poluídos de saber empírico que se escutam na tasca da esquina com a cerveja do fim de tarde! Esta é a verdade.
A meu ver, o ministro apenas pecou por escassez. Quem diz tabaco ou cinema pode dizer também prostitutas ou teatro. Ou vinho ou livros. Essa gente dos 600 euros mensais gosta é de luxos e vícios e assim viver à custa dos outros, comer com o que os outros ganham. 600 euros mensais??? 600 euros comensais, meus amigos!
Agora que alguns já deturpam o meu texto, acusando-me de extremista, para esses dou outro exemplo. De facto, não é necessário fazer insinuações torpes sobre os hábitos de consumo da malta abaixo dos 750. Talvez tenha exagerado ao insinuar que eles gastam o seu dinheiro em teatro… Mas peguemos em bens úteis: o queijo, por exemplo. Será que quem se queixa das taxas elevadas da saúde compra queijo corrente? Daquele da marca do supermercado? Não me parece, meus caros. Noutro dia vi uma senhora a comprar queijo de marca, francês, com um nome que ela de certeza nem saberia pronunciar, ou se sabe é porque lá esteve emigrada e, nesse caso não sabe dizer queijo em português. Olhei de alto a baixo para a senhora e reparei no aspecto lúgubre dos seus trajes, no cabelo de 3 semanas sem cabeleireiro e na chinela que escondia uma meia de algodão que dá pela canela. Uma dos 600 euros comensais, pensei. Ou até uma pensionista! Mas o queijo não era normal, não era de bola. Nem sequer era meia bola. Não era um quarto ou uma daquelas fatias triangulares, já embrulhadas, onde pagamos quase tanto como por uma bola inteira. Era fatiado! A senhora comprou queijo fatiado. E agora perguntam-se vocês, em pleno choque, quantas fatias vi eu a menina do supermercado a servir à senhora? Pois bem, meus caros, é melhor sentarem-se. Nenhuma! A menina não cortou nenhuma fatia! A senhora comprou queijo fatiado daqueles pré-embalados pela marca!!! O queijo mais caro de todo o supermercado em relação à quantidade comprada! As fatias vêm separadas por finos separadores em plástico e estão prontas a ser servidas no pão. Pão de sementes de girassol, por certo!
E esta Dona Judite? Estava à espera desta? Vai dizer que esta senhora não pode pagar taxas mais elevadas pelo serviço de saúde? I rest my case! E o do ministro já agora. Por falar em ministro, espero que ele venha a ler este texto e, como tal, ganhar novos argumentos para agravar ainda mais as taxas moderadoras da saúde - como é de bom tom.
Em último caso, pode-se dar o acontecimento inédito de um queijo influenciar um orçamento de estado.
2 comentários:
como certamente sabereis, sou daqueles que não recebe 600 por mês. decidi deixar para trás os tempos de stress, em que todos os 25 de cada mês era o feliz contemplado com uma bela maquia.
hoje resolvi ir ao Dingo Poce fazer umas comprinhas para a minha janta.
Claro está que o vinho e o queijinho foram as minhas grandes prioridades.
uma garrafa de Duas Quintas outra de Piriquita, 200g de Brie e uma embalagem de Caprice des Dieux ("un amour de fromage").
que me perdoe Correia dos Santos, mas jamais irei pagar as taxas de saúde aos amigos ou amigas como forma de fortalecer os laços que nos unem ou possam vir a unir. alguém se imagina num date numa sala de espera sobre povoada?
Eu sou daqueles que apoio o argumento do sr. ministro! O cinema é um luxo! E é por isso que eu já há cerca de dez anos, não ia lá ver qualquer filme. Não, não.
Fumar cigarros? Quem ganha menos de 600 €? Um crime em potência.
É exactamente por isso que eu nos últimos anos, em vez de me refugiar nestas duas actividades de gastos exorbitantes, ia sempre passar os meus serões lúdicos ao hospital e enquanto lá estava inalava hélio! Mas agora, também isso ficou caro? Ele tramou-me! E agora? que farei eu nos meus tempos livres? Já sei, vou para o terminal TIR inalar fumo de escape! Assim sempre posso continuar a comer "boursin", "rendelé", "emmental", "roquefort avec des las uves passes (raisins)" acompanhadinho de um belo Chateau margot de 64 avec la corque de cortice.
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