26/03/2007

Grandes Portugueses

Foi ontem a grande final. Aberta, aguerrida, bem disputada. O resultado, porém, foi o esperado: ganhou Salazar, o ditador.
Na hora do anúncio, Jaime Nogueira Pinto disfarçou o orgulho com a falsa modéstia de ter evitado discursos de vitória. Portas, Ana Gomes e Júdice mostraram algum alheamento sensato. Gonçalo Cadilhe manteve o tom humorístico com que encarou todo o concurso. Clara Ferreira Pinto, Leonor Pinhão e Hélder Macedo iluminaram a noite com posturas e discursos que só não agradaram aos menos atentos. Finalmente, Rosado Fernandes exaltou o público ao traçar a primeira análise sociológica do resultado e Odete Santos, que apadrinhou Cunhal na contenda, não disfarçou a derrota. Mais, empolgou-a com um entusiasta discurso antifascista, de indicador erguido na direcção de Nogueira Pinto, concluindo com um “O fascismo não vencerá”. Antes disso já tinha trocado várias palavras com o público, repudiando aquilo a que chamou de "propaganda fascista constitucionalmente proibida". Deu importância a uma votação condenada à partida a ser vista como inquinada por fanáticos, enfiando uma carapuça que Portas já tinha recusado quando, e muito bem, afirmou não haver nada a retirar de uma votação claramente mobilizada por duas facções extremas que se digladiaram até final, fruto de uma mobilização negativa.
Para mim, se descontarmos os telefonemas pagos por velhos inadaptados saudosistas, idiotas de cabelo rapado, ou amantes compulsivos de vodka tatuados de Che Guevara (que certamente não sabem quem foi), o grande português foi, sem dúvida, Aristides. Mérito de ter sido defendido por José Miguel Júdice, o mais bem sucedido dos advogados portugueses, e de vir embalado pelo marcante síndrome do Schindler de Spielberg. Com pena minha, já que o trono assentava melhor a D. João II ou Camões.
Finalmente, antevendo as baboseiras que serão ditas em breve pelos quadrantes mais alarmistas e disparatados dos nossos comentadores, deixo-vos uma história que ilustra o que foi esta eleição dos Grandes Portugueses e o impacto sociológico que causou na nossa população de brandos costumes: aqui há uns meses correu uma mensagem nos telemóveis de muita gente com que privo. Em alarme, alguém pedia para ligarmos urgentemente para um número. Claro que, perante um pedido alarmista de uma amiga, toda a gente o fez. Do outro lado ouvia-se: “O seu voto foi para António de Oliveira Salazar”. Era uma brincadeira que nos fez gastar uns trocos. No nosso caso, a remetente da mensagem era… uma iraquiana radicada com toda a família em Lisboa!

3 comentários:

Le disse...

Caro Palmilha Direita,
Gostaria de acrescentar ao resumo que elaboraste dois ou três pontos:
1. a verdade é que, esperado ou não, o vencedor foi António Oliveira Salazar. E isso, mesmo que a brincar, provocou-me um pequeno distúrbio no diafragma, que lá persistiu durante uns segundos.
2. Foi bem destruído pelos comentadores (defensores de personagens) o dramatismo da vitória de Salazar.
3. Por último, a confusão do realizador! Sem dúvida o aspecto mais cómico da noite. Caso o vencedor fosse Vasco da Gama ou outro qualquer dos 9 mais votados, o final deste programa que durou seis meses seria embelezado com um clima de apoteose (típico, aliás, de programa televisivo) em que o vencedor surgiria repetidamente no ecrã, em grandes planos demorados, durante os quais as vozes eufóricas da apresentadora e daqueles que nele votaram sairiam estridentes pelas colunas do aparelho televisivo. Todavia, ontem, ao ser anunciado o Grande Português, fiquei com a sensação de que apenas faltaram os ciprestes ao vento para que aquele estúdio se assemelhasse a um cemitério!
O Realizador, surpreso ou não, não sabia que planos fazer, e, assustado, mostrava palidamente o vencedor, com um relevo pouco superior ao dos restantes concorrentes! Parecia que, pelo facto de ter ganho um fascista, a própria realização se tornou também fascista (ao não querer passar a imagem do maior exemplo do fascismo português!). Foi mais estranho ainda o que se passou a seguir: Maria Elisa anuncia o fim do programa, inicia-se a música oficial dos grandes portugueses, os comentadores levantam-se e gesticulam uns com os outros, e depois! mesmo nos dois últimos planos do programa surgem duas imagens: a do vencedor, e, imediatamente a seguir, a de Zeca Afonso!

Santa Ignorância disse...
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Santa Ignorância disse...

Ora meu caro Le, isso apenas justifica a vitória do Oliveira de Comba Dão! Tinhamos um homem que se aventurou pelos mares e descobriu caminhos marítimos que revolucionaram o comércio, a geografia, a astronimia... mas claro isso teve impacto mundial. O melhor seria escolher um politico qualquer sem relevância nenhuma(mesmo para Portugal). Afinal fez o que qualquer ser pequeino faria, pôs-se em bicos de pé em cima de polícias políticas e ditaduras de medo! GRANDE PORTUGUÊS! Sem duvida, se o Oliveira é GRANDE PORTUGÊS, eu quero ser um mero cidadão do mundo!